sexta-feira, 15 de maio de 2009

Minha vida em Angola! por Jaqueline Moreira

Jaqueline é uma amiga, recém formada em Serviço Social, que ama a Deus e tem senso de missão. Agora ela está na Angola. Que Deus a abençoe!

23/04 – O dia inteiro foi despedindo-me dos meus amigos e família brasileira... Confesso que não foi nada fácil, chorei muito por deixar as pessoas que tanto amo, afinal sou humana, tenho coração e amo a todos.

Finalizei realmente minha mala, próximo de minha saída para a rodoviária de Americana, minha família me levou... As lágrimas expressaram todo meu sentimento de deixá-los para cumprir um sonho e uma missão.

Às 23h10, meu ônibus saiu rumo a minha última viagem brasileira, cidade maravilhosa.
24/04 - Cheguei ao Rio de Janeiro às 8h, meu amigo estava me esperando junto com o taxista, fomos direto para a casa dele, e saímos de imediato para pagar o aéreo.

Conheci as principais praias num ônibus, e me questionando por que não tinha ido antes... Até que encontrei um grande problema que deixou eu e meu amigo muito preocupado e com fome... Cada segundo era preciosíssimo... Meu cartão de crédito não passava de jeito nenhum... Tivemos que ir a minha agencia para sacar o valor, mas não foi possível porque, na correria, deixei meus documentos na mala, tivemos que voltar, mais 3 horas dentro do ônibus (ida e volta).

Conseguimos chegar ao banco, faltando 30 minutos para fechar, estava uma fila gigante, mas o atendente passou-me na frente porque já havia ido de manhã. Fomos direto a agencia, quando ela nos disse que o vôo sairia às 22h, eu e meu amigo não sabíamos se riamos ou chorávamos... Quanto nervosismo haviam os passados. Se fosse às 19h, conforme me falando por telefone, não iria dar tempo, teríamos mais 1h30 para chegar a casa... Não chegaria às 18 no aeroporto, muito menos na casa. Sendo assim, comemos nosso almoço às 16h10.

Chegamos à casa do meu amigo, às 18h40, tomei um banho de gato e fui para o taxi. Cheguei ao aeroporto 10 minutos atrasada do limite, ou seja, às 20h10, fui direto fazer meu check-in, e às 21h eu já estava dentro do avião, realizando mais um sonho.
Às 22h15, o vôo iniciou a viagem, que coisa maravilhosa e tranqüila estar nele, não senti nada, pelo contrário, melhor transporte que já andei. Pegamos turbulência sim, mas não é nada tenebroso. A janta que serviram estava maravilhosa...

24/04 – Às 4h, horário de Brasília, eu adiantei meu relógio no horário de Angola, ou seja, 8 horas. Antes serviram café da manhã maravilhoso.

Cheguei a Luanda às 9h, e já percebi a diferença: o clima é de muito calor, o céu é diferente, a paisagem não tem as mesmas cores do Brasil. Às 9h45 eu já estava esperando me buscarem... Foi uma sensação muito estranha, eu estar na saída parada com minhas malas e todos me olhando, todos que estavam esperando pessoas chegarem, ou seja, 98% angolanos. Logo apareceu um rosto conhecido que veio em minha direção, nos cumprimentamos e fomos para a caminhonete... Três angolanos nos acompanharam querendo nos ajudar, eu não sabia se estavam com o meu amigo ou não, uma vez que chegaram junto com ele e me deram a mão em cumprimento... Só percebi que não eram quando me pediram 50 dólares pela ajuda com as malas e de colocar e amarrá-las na caminhonete.

Dentro do carro, o Lucas me explicou algumas coisas diferentes que acontecem em Angola... Inclusive que viria muito carro grande... No caminho para casa, parou para eu conhecer o seminário salesiano, de frente fica a faculdade católica, a única em Angola que tem o curso de Serviço Social, porém não entrei, a fachada é bem diferente da nossa... No seminário conheci dos padres, mas não lembro seus respectivos nomes...

Voltamos para a estrada, esta é muito diferente do Brasil, no Brasil é raro quando encontramos pessoas vendendo coisas no trânsito ou semáforo... Aqui não, isso é normal, tem homens e mulheres, e se vende de tudo: desde água, sumo (suco), gasosa (guaraná), frutas, até carnes, roupas no cabide e, eletrodomésticos... As idades desses angolanos são variadas, desde criança a idosos...

No percurso eu quase não consegui falar, as palavras sumiram, não estava sentindo o meu coração, mas em momento algum me senti chocada, grande parte do que vi já havia passado na televisão... Só sei que até agora não sei qual o motivo das palavras não terem saído... Não conseguia acreditar que eu havia chego, que estou em outro país e principalmente, na tão pobre África... Ouvi várias vezes o Lucas me falar: - Isso aqui é África... Não fiquei sem falar com ele, apenas respondia o que me falava... É inexplicável... Talvez fosse o cansaço de praticamente ficar sem dormir durante duas noites (ônibus e avião).

Paramos num estabelecimento de um português comprar garrafas de água... Eu não desci, aproximou um menino aparentando três ou quatro anos de idade, e ficou sorrindo e me olhando pelo vidro da caminhonete e me disse a palavra brinquedo... Automaticamente lembrei-me dos muitos brinquedos que doamos para crianças brasileiras e de alguns que estão no banheiro da minha casa no Brasil...
Após seguimos para Kalakala, e ele continuou a fazer perguntas e relatar suas experiências... Que paisagens belíssimas da natureza, parece tudo perfeito, mas não é...

Chegamos a Kalakala quase 15h00, paramos para tirar uma foto minha no portal da fazenda... Ao chegar ao portão, tocou as primeiras buzinas e foi aparecendo os meninos, os educadores e voluntários... Cantaram algumas musicas, me senti totalmente anestesiada e sem palavras... Um menino dançou rapidamente e em minha frente alguns passos do Kuduro. Após as palavras do Lucas de apresentação, eu tive que dizer as minhas não me lembro de nada... Parecia que estava tendo mais um de meus sonhos com Angola...

Lembro de algumas carinhas assustadas, de algumas sorrindo, das boas-vindas da Carola (argentina), que ficou muito feliz por eu chegar, dividimos a mesma casa de banho (banheiro). Levou-me para conhecer a casa e depois meu quarto. Meu quarto tem ar condicionado, duas beliches, eu durmo em uma cama, sobra três para quem quiser me visitar... RS!

Ao deixar as malas no quarto, Lucas me chamou para ir conhecer o restante com quatro visitantes adolescentes de uma paróquia... Logo após, fomos para a sala, não conseguimos conectar a internet... Ficamos batendo papo e logo adormeci... Acordei e fui matar bicho (comer) e fui chamada por Carola para ir à missa na nossa capela. Todos participam da Santa Missa, aos sábados, eu me emocionei com o canto ao vivo dos meninos... E no final o padre (uruguaio) e nosso diretor espiritual me chamou para dar boas vindas...

Logo após a missa serviu o jantar, com oração no inicio e no fim, sentamos olhando para os meninos, conversei muito com o padre, mas não quis comer, caso contrário não comeria no churrasco à noite... Os meninos demoraram muito para se aproximar de mim, ao sairmos da capela alguns se reuniram próximo de minha foto e fui falar com eles, bem como no final da janta, mas me olham muito... Conversei com alguns, até que eu e Carola fomos para o quarto, conversamos muito, cada uma tomou seu banho e fomos para o churrasco no fundo de casa... Neste participou os voluntários e convidados, estava presente: Lucas, Paulo, Carola, Padre, Manuel e Pedro (portugueses) e um caseiro que mora na nossa fazenda.

O churrasco foi muito farto, conversaram e riram muito, eu mais observei do que falei... Não estranhei o arroz, mesmo tendo gosto diferente. O ruim é que a noite tem muito mosquito, tivemos que ficar na sala com as portas fechadas e o ar condicionado ligado.

Fui dormir muito tarde e muito feliz, posso dizer com toda certeza que minha primeira noite em Angola foi inesquecível!

26/04 – Meu Deus que domingo corrido, porém muito importante. Acordei no meu horário, nessa primeira semana será assim, não preciso seguir o relógio da casa. Os meninos e voluntários acordam às 6 horas, mata bicho é servido às 6h30. Acordei às 8h. Lucas disse para eu conhecer a enfermaria, Lucas e Paulo estavam fazendo curativo em uma senhora que caiu na aldeia... Não tive coragem de olhar, talvez eu tenha que ajudá-los nessas questões... Precisarei de muita coragem e força de Deus, uma vez que não me sentia bem com essas questões, mas minha mente e meu coração estão abertos para tudo e sei que eles precisam de mim...

Logo, eu e Carola saímos com Lucas para buscar pomada para um senhor com lepra na aldeia, conheci duas irmãs salesianas de Uruguai, extremamente simpáticas.
Na estrada contemplei a bela natureza de Angola, como também alguns lugares bem precários... mas tudo isso aqui é África.

Recebi minha primeira visita em minha casa angolana, grande amigo Simão veio me visitar, juntos fomos com o Lucas conhecer as aldeias, e levar o Corpo de Cristo para dois homens doentes. No caminho encontramos pessoas que nos pediram boleio (carona), fiquei admirada quando vi uma cena que só via em filmes – mães com seu filho nas costas, mais calões com 20, 40 kilos de águas levando na cabeça, ou senhoras bem idosas fazendo um grande percurso... Lotamos nossa caminhote com elas e de galões...

Passamos e paramos em três aldeias, novamente vivenciei cenas de filmes, meu Deus quanta criança sem nada para fazer, todas sujas, com poucas roupas, barrigudas, vivendo na miséria extremas... Graças a Deus não me senti mal e sim feliz por Deus ter me dado essa oportunidade de fazer a diferença na vida dessas famílias... Fui o centro das atenções das crianças, mas foram pouquíssimas que se aproximaram.

É importante relatar que as mulheres angolanas trabalham muito mais que seu marido, e passam seus dias sentados na frente de seus barracos, muito piores que de uma favela brasileira, e infelizmente, muito sujo... Porém, o povo é muito alegre e todos querem nos cumprimentar... O Lucas é muito querido por eles, gritam seu nome para dar tchau.

À tarde, realmente foi uma grande experiência de vida, mas acima de tudo espiritual, pensei em diversas pessoas brasileiras que necessitavam estar comigo para refletirmos que o pouco que temos é muito perto dessas famílias que vivem dia após dia sem nenhuma perspectiva de melhoria, vivem assim não porque querem e sim por não terem oportunidade de mudanças e seus antepassados assim viveram.

Foi uma felicidade muito grande visitar duas “casas” e levar Jesus Cristo para eles e vivenciar a felicidade em recebê-Lo com a fé e esperança de serem curados.

Na última aldeia, Lucas fez rapidamente uma dança com as crianças, meu Deus, apareceu muita criança do nada, acho que tinham umas 50 ao redor dele, todas felizes, cantando, dançando e batendo palmas, eu tive que segurar a emoção porque o coração bateu forte, queria estar lá no meio, queria também tirar sorrisos e principalmente, tirá-las da monotonia cotidiana. Mas terei que amadurecer nesse sentido, a cultura angola das aldeias é bem diferente de minha cultura. Porém é necessário fazer algo com a esperança que um dia mudaram.

Fiquei muito feliz quando o Lucas me disse que irei trabalhar com as famílias das aldeias, principalmente quando a criança estiver faltando muito das aulas, irei analisar o motivo e tentarei fazer com que ela permaneça. Sei que será um desafio muito grande porque os pais não estudaram e não conseguem exigir que o filho estude, para eles é cômodo ter o filho na aldeia, esses filhos jamais dão trabalho, principalmente quando estão doentes, não há nada para ser feito... E nós, principalmente, eu com os professores iremos fazer algo para esses filhos não sofrer tanto quando estiverem enfermos, e tentaremos de tudo para que ele não venha a óbito...

Voltamos para Kalakala no inicio da noite, fiz todo o percurso calada, com mil coisas passando em meu coração, pena que não sei como explicar para vocês, é só estando aqui para sentir e vivenciar, mas a felicidade jamais some, que bom que Deus me deu essa graça de fazer a diferença na vida de quem realmente necessita.

Fomos jantar os meninos ainda me olham com tímidos e com vergonha de se aproximarem. Mas é normal, sou uma pessoa nova e muito diferente deles.

Fui dormir sem hora certa para acordar, isso durante a semana inteira porque é minha semana de adaptação, mas às 6h acordei com o barulho dos meninos, meu Deus quanta falação... Eles falam muito rápido e quase não dá para eu entender! Continuo mais observando do que falando! Porém, voltei a dormir!

26/04 – Foi um dia extremamente tranquilo, não sai de Kalakala, aproveitei para me aproximar dos meninos, está dando certo. De manhã o Lucas me levou para conhecer três salas de aulas com as crianças das aldeias, que lindas, porém tinha duas que estavam dormindo na carteira, o Lucas encaminhou-as para o nosso enfermeiro fazer análise.

Após o almoço, observei os meninos internos fazerem limpeza em seus quartos, eles dividem um quarto com mais três, alguns estavam limpando os pátrios, é uma forma de incentivarmos a limpeza porque eles não tiveram esse costume com seus familiares.
Na janta, um menino pediu para falar comigo em particular, e lá fomos nós sentarmos ao ar livre, queria dizer que gostou muito de mim, eu sorri, e meus olhos nadaram em lágrimas, tive que contê-las, meu Deus, ainda não fiz nada para ele gostar de mim, apenas estou observando-os... Quanta falta de amor e de atenção... Conversei rapidamente com ele porque logo fiquei rodeada de meninos, todos me fazem perguntas ao mesmo tempo e fico perdida porque não entendo algumas e não dá para responder todos ao mesmo tempo...

Às 21h todos nós nos reunimos com os meninos na capela para rezarmos e darmos feliz noite.

À noite, infelizmente o sono não veio, fiquei até tarde conversando com o Lucas e Paulo, um contando para o outro histórias vividas no Brasil, até que o Paulo quis ir deitar, e todos nós fomos, mesmo assim demorei muito para dormir, deve ser devido ao fuso horário, afinal são de 4 horas, mas só no horário de dormir porque com o horário da refeição já está certo e me habituei.

28/04 – Hoje acordei com Lucas batendo em minha porta, era 9h40, estava louca para tomar um banho, mas infelizmente fiquei sem porque acabou nossa água...
Hoje foi um dia estressante, muito calor e fiquei muito tempo sem ter nada para fazer, procurei mais não tinha, portanto fiquei boa parte do dia sentada na sala lendo um manual internacional dos missionários salesianos.

Ah, na hora do almoço com os meninos tive que comer uma comida típica de Angola, em especial das aldeias, chama-se Funji/Fungi (não sei como escreve), é parecida com a polenta dura brasileira, porém sem nenhum tempero, até mesmo sal, o Lucas disse que se colocar tempero os meninos não comem, e todos ficaram me olhando para ver meu rosto ao comê-la... Com a graça de Deus e muito molho da carne eu consegui comer... E comerei novamente.

Na janta foi servido arroz e a mesma carne, comi pouco porque Lucas fez rosquinhas de coco (igual de minha mãe, ambos lembramos-nos de nossas mamas) e já sabia que iria fazer lanche para nós. Todas as noites temos que comer com eles, nem se for um pouquinho, mas temos, é impressionante a quantidade de comida que eles comem e repetem, Lucas me explicou que no começo alguns deles chegaram a desmaiar de tanto comer... Alguns meninos continuam com vergonha de mim, até disseram ao Lucas que não repetem porque eu estou olhando para eles, não tem como não olhá-los, sentamos de frente para todos.

Lembrei-me de uma coisa, muitos meninos me chamam de irmã Jaqueline ou irmã Jaquí (com acento no í).

Infelizmente tentei conectar a internet para mandar e-mails, mas novamente não consegui, queira Deus que amanhã de para enviar este.
Nesses quatro dias em Angola, posso dizer que estou muito bem e feliz, estou sendo tratada bem por todos e quero começar logo a trabalhar... Graças a Deus em nossa geladeira não falta nada, porém senti falta do nosso pão francês, aqui em Angola ainda não encontramos somente pão caseiro, que é comprado...

Peço a Deus por nossa saúde, que ela esteja em equilíbrio e que todo mal não chegue até nós. Amém!

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